Acolhida e Partilha

por Frei Zilton Salgado, op

A narrativa evangélica do texto joanino ao fazer encontrar Jesus e a mulher samaritana (4, 1-42), assenta suas bases sobre um universo de contrastes e oposições. De um lado, um homem; de outro, uma mulher. Por um, um judeu observante; por outro, uma mulher da Samaria.

O desenrolar do texto dá sequência a esse conjunto de posicionamentos, os quais, aparentemente, revelam-se opostos, de modo diametral.

É, justo, dessa conjuntura de obstinações e – porque não dizer rabugices – que a iniciativa ecumênica, impulsionada pelo CONIC, para a oração pela unidade cristã, vem retirar inspiração.

A inspiração ecumênica, isto é, o anseio por um diálogo fraterno, por uma experiência de proximidade e, até mesmo, cumplicidade, sustentada pela fé, que compartilha muito mais do que raízes comuns, descobre na narrativa do encontro entre Jesus e a mulher samaritana a boa imagem que deve impulsionar as reflexões e práticas de oração em prol da unidade cristã para este ano.

O texto joanino é emblemático: páginas e mais páginas de comentários já foram escritas na tentativa de perscrutar o sentido profundo das afirmações de Jesus e, certamente, também, da mulher samaritana, cujo nome, infelizmente, a tradição não nos legou.

Ainda assim, para além das especulações teológico-interpretativas podemos destacar dois elementos, os quais podem iluminar nossa disposição para o diálogo aberto e disponível para se transformar em ação de amor, nesse contexto da Semana de Oração.

Em primeiro, o texto revela-nos a acolhida.

Por certo, esse é um movimento em duas mãos. Jesus acolhe a mulher samaritana; mas, também, ela acolhe. Jesus interpela, dizendo “dá-me de beber” (v. 4). A mulher samaritana, do mesmo modo, solicita, reclama e pleiteia: “Senhor, dá-me essa água” (v. 15).

Esses pedidos exprimem – para os dois lados, apartados pela tradição cultural – o reconhecimento de uma necessidade e a percepção de que o outro pode ser – senão, ao menos, tornar-se – caminho, através do qual se pode saciar, sanar, esse imperativo.

Para além da acolhida, em segundo, a cena com a mulher samaritana suscita a atenção à partilha.

A hospitalidade – essencial e visível no cânone bíblico desde a experiência de Abraão (Gn 18) – carrega consigo a prática da generosidade, que, em primeiro lugar, dá-se a partir daquilo que se tem. Como já ensinou Jacques T. Godbout, “toda ação de hospitalidade começa com uma dádiva” e essa não é meramente uma coisa que se pode trocar, mas, sim, “uma relação social” que se vem a constituir.

Que nos ensina, então, o íntimo contato entre Jesus e a mulher samaritana?

Seguramente, que aquela atitude de abertura.

Abertura que permite, de fato, que o outro seja acolhido; que garante que um frutuoso intercâmbio aconteça. E que nesse intercâmbio, isto é, na partilha, sempre ganhamos.

Que a experiência desta Semana de Oração, verdadeiramente, abra-nos para ir, de coração escancarado, ao encontro, que é sempre oportunidade de aprender a sermos/vivermos a unidade!

Que a experiência desta Semana de Oração constitua, para nós, esse poço, onde encontrando Jesus, possamos ser saciados!

Que o Cristo seja visível no outro, que é nosso irmão e irmã!

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